Estou afastada daqui já faz um tempo, então decidi me forçar a romper esse silêncio e acabar com esse ócio literário postando uma coisa que é muito minha, mas que agora vai ser dividida com quem se interessar e quiser “perder tempo” lendo. Vou postar hoje uma folha antiga do meu diário, são coisas bobas que eu escrevia para matar o tempo e também para que não fossem esquecidas. Escolhi uma bem pessoal. Espero que ninguém se sinta ofendido.
26 de maio de 2006
15:28 hrs
Hoje pela manhã ouvi uma “brincadeira” que me ofendeu, na verdade, essas coisas sempre me ofendem. E me perseguem desde que eu me entendo por gente, aonde quer que eu vá, elas não mudam e a mais comum de todas é: “hei menina, você não conhece praia?” Então irritada solto uma exclamação de protesto qualquer e fico magoada. Sei que é bobo se ofender por tão pouco, mas é que já aconteceu tantas vezes que já me encheu.
Quando eu era bem pequena, tinha uns quatro, cinco anos, ouvia as pessoas se admirarem por eu ser tão transparente, a ponto de ficar azul quando sentia frio. Minha pele ficava pálida deixando visíveis veias roxas nas mãos e nos pés, as unhas e os lábios também ficavam roxos (se bem que ainda fico assim hoje) e isso me rendeu inúmeros apelidos que me levavam a fúria. Posso até enumerar alguns aqui: “lagartixa branca”, “velinha (diminutivo de vela)”, “morta (por causa da translucidez quando sentia frio)”, “leite”, “lagarta de coco ou bicho de coco (o que tanto faz, dá tudo na mesma)” e “fantasminha”.
Tudo isso me fazia me sentir uma estranha, um ser totalmente anormal, e até achava que era a única no mundo a ser assim. Hoje sei que não sou, graças a Deus, mas naquela época eu era pequena demais para entender isso, e sabe não é? O que a gente aprende em criança, leva para a vida toda, e o que eu trouxe comigo foi essa mágoa.
Nessa mesma época da coleção de apelidos, minha tia adotou uma bebê linda de pele negra, face redonda e olhos vivazes, e eu passei a admirá-la enquanto dormia no berço, sonhando em como seria se minha pele fosse igual a dela, cheia de viço e brilhante. Lembro que passava meio mundo de coisas na minha cabecinha, mas o que ficou foi esse desejo de ter a pele daquela cor e não mais ser motivo de chacotas.
Minha prima cresceu, assim como eu, e veio nos visitar nas férias, então enquanto conversávamos, surgiu entre a gente esse assunto e ela me revelou que sofre preconceito por causa de sua cor, que queria ser igual à mãe e as irmãs e que odiava quando lhe davam apelidos ainda mais pejorativos que os meus. Eu a compreendi tão bem!
Infelizmente o que as pessoas mais sabem fazer é serem cruéis com os próximos, e hoje sei que esse é um assunto delicado demais e requer muita compreensão da nossa parte, pois, se quisermos viver em harmonia, temos que aprender a ceder, isso não quer dizer que devemos alimentar e aceitar o preconceito e sim que não dá pra partir pra porrada toda vez só pra mostrar que eles estão sendo infames.
PS:. Pelo menos uma coisa boa temos hoje: conseguimos acabar com os apelidos. É, eu tenho um nome!