quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Enquanto Todos Dormem...


As pessoas costumam dizer que a noite seus medos parecem maiores, suas dores parecem enormes e os fantasmas mais assustadores. Talvez elas tenham razão, para uns a noite esconde segredos inconfessáveis. Não durmo sozinha desde que era criança, ou melhor, não durmo nunca,  mas isso também não é bom, acompanhada não posso derramar minhas lágrimas como devo, se ouvirem meu pranto, exigirão explicações que não quero dar, então as derramo silenciosamente enquanto todos dormem, apenas meu travesseiro é testemunha, mas silenciar a expressão da dor não a diminui e eu sigo assim, sofrendo sozinha. Minha mãe não é boba, já deve ter visto meu travesseiro úmido pela manhã, mas ela cala, finge que nada aconteceu, me deixa só, não me interroga. Por um lado isso é bom, não gosto de dar explicações, mas por outro, dói ainda mais esse silêncio, é quase um abandono. Enquanto sofro noite após noite, tenho medo de dormir, não fico sozinha em nenhum comodo da casa, todos em volta me olham como se eu fosse louca, não acreditam em mim, perdem a paciência comigo e me tratam como um peso. Fui diagnosticada como esquizofrênica, vejo mortos, ouço vozes, tenho fobias, tudo conspira a favor do diagnostico, no mundo real não sobra espaço para o sobrenatural, preferem disferir uma sentença. Não me lembro ao certo quando isso começou, acho que acontece desde sempre, pois dizem que nunca, desde que nasci, tive uma noite de sono tranquila. Não me lembro de nada daquela época, mas do restante de minha vida, não me lembro de outra coisa, até me acostumei com eles, com os vultos, com as vozes, eram minhas únicas amigas, mas de um tempo para cá, eles também me tratam mal, me dizem coisas dolorosas, me fazem sofrer, me perturbam, não me deixam ter paz. Não todos eles, um em particular, o homem de asas negras, esse me consome com seu veneno. Os outros até tentaram interferir nas atitudes dele, mas foram rechaçados, agora apenas me olham com pesar e balançam a cabeça, me estendem a mão de longe, mas não ousam se aproximar. O homem me vigia dia e noite, mas à noite, ele parece ganhar mais força, à noite tudo parece pior, deito virada para minha companheira de cama, mas sinto sua presença e ouço sua voz, sei que ele está encostado no canto do quarto, próximo a minha cabeça de braços cruzados, uma perna ereta e a outra flexionada, as asas encolhidas, só são usadas quando quer me intimidar, quando ouso enfrentá-lo, se não tivesse mostrado há muito tempo que não sou de todo fraca, ele já teria me arrastado com ele para não sei onde, mas ele sabe o quanto temo que isso aconteça, ele conhece tudo que se passa em meu ser, não tenho como fugir, nem com quem contar. Enquanto todos dormem, eu sofro sozinha e silenciosamente.

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